sábado, 15 de dezembro de 2007

Um pouco sobre mim, contado por mim mesmo e em um momento de extrema e rara lucidez

Se isso fosse um diário, eu começaria com meu primeiro ato, do qual, diga-se de passagem, não tive culpa alguma: meu nascimento. Rasgando o mundo às sete horas da manhã, minha epopéia começou me fazendo acordar cedo e essa sina pontuou a minha vida. Do tempo intra-uterino não me lembro de nada, pelo menos não que eu me lembre. Assim, já começo com um déficit de nove meses. Tempo esse envolvido em brumas líquidas e em pensamentos que ainda hoje me são um mistério. Talvez esses tenham sido meus pensamentos mais originais.

A primeira palavra inteligível que saiu da minha boca não teve glamour algum, mas teve lá seu toque de originalidade: titia. Não, não era um conflito materno nem uma retaliação a alguma mamadeira esquecida. Mais uma vez, fui vítima. Culpa da minha tia Suely (irmã da minha mãe, que posteriormente casou-se com o irmão do meu pai). Enquanto minha mãe trabalhava, ela cuidava de mim. Sabe Deus porque, ela decidiu que já era tempo de mexer nessas relações linguísticas. Diriam os mais reacionários que faço alarde por nada e que "titia" não nada demais. Feito seria ter dito paralelepípedo. Mas aí seria mais que original, seria quase demoníaco.

Eu creci num tipo de lugar que você nem se dá conta da beleza e majestade. Isso, até o dia em que se sai e se depara com um mundo gigantesco. Minh infância foi rica e preciosa. Repleta do encanto comum dos lugares mais afastados e retirados. Retiro do Muriaé. Quinta distrito de Itaperuna, cidade situada no noroeste fluminense (não o time, por favor). Itaperuna foi a primeira cidade republicana do Brasil. Em fevereiro de 1889 foi inaugurada a primeira câmara de vereadores desse nosso Brasil varonil (em nome de todo itaperunense, peço humildes desculpas por isso). Eu vivo repetindo esse conhecimento inútil como forma de não perder um certo orgulho interior e interiorano.

Em Retiro, o tempo passa muito devagar e às vezes dá a impressão absurda de nunca passar. Mas o tempo é inexorável e inexoravelmente passa. A minha infância definiu a minha vida de formas muito variadas. Ela me acompanha nas carências não supridas e no meu desespero em tentar ver algo novo nesse mundo já tão gasto de se olhar. Sou o primeiro filho de um total de quatro; e sou a prova viva de essa história de o irmão mais velho é sempre o mais mal humorado foi definitivamente inventada por algum irmão do meio, ou talvez um caçula.

A história não acaba aqui, afinal daqui a quatro dias eu completo vinte e sete primaveras. Isso é bem mais que um clichê. Realmente nasci na primavera, bem no finalzinho pra ninguém fazer um comentário maldoso.

sexta-feira, 16 de novembro de 2007


Poderia começar esse post da maneira habitual com a qual venho dando essa notícia, mas prefiro ir direto desta vez: ESTOU NOIVO. Escrever isso é fácil. Difícil foi esconder a caixinha das alianças. Não entrarei em pormenores, mas me espanto até agora de ter conseguido fazer uma surpresa. Eu tenho olhos muito grandes e por isso mesmo a minha alma fica muito vislumbrável. Não sei como a Rosa não percebeu. Sim, no meu pequeno planeta também há uma Rosa, mas a redoma era minha e não dela. Ela me amou primeiro, mas isso foi apenas até eu me dar conta de que eu a tinha em amor; era só transformá-lo. O que no fundo significou simplesmente tê-lo deixado seguir seu curso natural. Não vou me extender. O que me pesa é o silêncio, e o meu silêncio é dela e só ela traduz.

A mesma pessoa pela vida inteira.

Azul...

terça-feira, 30 de outubro de 2007

O projeto dos meus sonhos

Ainda guardo viva uma memória bem específica da minha infância: quando eu subia um grande armário de alvenaria para pegar, lá no alto, uma coleção de livros de arte que a minha mãe guardava. Não sei dizer ao certo o que me chamava mais a atenção. Se eram os projetos e exercícios, ou conhecer um pouco da vida e obra de grandes pintores. Não sei se uma pessoa já nasce com inclinação para alguma coisa, mas se isso for verdade, talvez explique o porquê do meu fascínio por arte e literatura. Não me recordo de alguém vir até mim com um livro debaixo dos braços. Sempre era um impulso próprio. Um impulso proporcional à minha paixão.

Vindo de uma família cristã, sempre vi a arte como um forte indício da nossa natureza original em Deus. Nosso desejo de criação como resquício da Criação maior. O Sublime que perspassa o decaído, o desfigurado, o vazio. À época de escolher um curso universitário, eu queria os dois: a literatura e a pintura, mas por um capricho acadêmico, eu precisava escolher apenas um. Como se fosse possível escolher entre matar a sede ou matar a fome, enquanto os dois anseios pulsavam desmedidos na alma. Minha idéia era fazer um curso oficialmente e cursar o outro como ouvinte. Não queria o título, queria o conhecimento. Apesar da Faculdade de Letras e da Faculdade de Belas Artes ficarem em prédios vizinhos, o tempo foi ainda mais caprichoso, e eu me tornei apenas bacharéu em Literatura Brasileira.

Foi justamente cursando Letras que conheci a Cruzada Estudantil e o seu ministério universitário, o Alfa e Ômega. Na companhia de outros universitários amadureci, fortaleci a minha fé e fui impactado pelo testemunho dos missionários, com os quais andava diariamente. No correr do tempo, fui agraciado por Deus com a chance de servi-lo nao apenas com a minha escrita, mas também com o meu traço e com a minha criatividade. Sem mesmo planejar, me vi envolvido pelo design gráfico e pela edição de vídeo.

Em janeiro de 2008, o Alfa e Ômega vai realizar um projeto missionário diferente de tudo que já foi feito. Um projeto onde pessoas com inclinação para design, tradução, produção de textos, vídeos, fotografia e publicidade terão a chance de mudar a cara do movimento.Num tempo em que temos vivido a maior crise espiritual da história, tem sido um grande desafio chegar ao coração dos estudantes universitários. Apesar de sabermos que o conteúdo do evangelho não pode ser adulterado, ele precisa ser exposto de forma adequada a esses jovens.

Mas por que escrever sobre um pouco da minha vida para falar de um projeto missionário? Simplesmente para dizer que o quanto meu coração está nisso. Eric Lidell, o famoso corredor cristão, disse que Deus o havia feito veloz, e quando ele corria, podia sentir o prazer dEle. Guardando as devidas proporções, o mesmo acontece comigo. Quando meu lápis corre sobre uma folha de papel, ou passo horas à frente de um computador preparando material – atividades que normalmente não consideramos “espirituais” – sinto o prazer de Deus. Sinto Seu prazer porque essa é uma maneira profundamente pessoal de glorificá-lO.E esse é um sentimento que transcende a satisfação pessoal por se fazer o que gosta. Tem mais a ver com a consciência de que estou cumprindo o propósito para o qual Deus me criou.

segunda-feira, 29 de outubro de 2007

Noite alta
escura
e silente.
O luto
precede
a luta.
A luta
procede.
Eu luto.

terça-feira, 16 de outubro de 2007

O tema é recorrente.

segunda-feira, 3 de setembro de 2007

Ausência prolongada

Esse caderno virtul ababa me surpreendendo por durar tanto. Estou envolvido em outras histórias, dessas histórias que escrevo com imagens. Em algum momento eu volto.

domingo, 12 de agosto de 2007


Eu sou/estou exatamente assim: o escuro iluminado.

O pessimismo ainda ronda. Por onde andará o sopro de Deus?

quinta-feira, 2 de agosto de 2007

Post Script

De um tempo em que tudo o que eu queria ser da vida era poeta...


Escuta,
Não tenho nada a dizer.
Eu só tenho fome.
Essa fome endoidecida dos olhos.
Essa fome de terra e de miragem.
Olha,
Não tenho nada a mostrar.
Eu só tenho essa escuridão.
Essa escuridão comum das vozes.
Essa escuridão tão minha e tão alheia.
Espera,
Eu só tenho pressa.

domingo, 15 de julho de 2007

OTerrível Malaman!

De todos os grandes vilões da história, nenhum me criava tantos calafrios quanto Malaman. Sei hoje que esses meus arrepios não eram assim tão solitários. Acabei por descobrir, com o tempo, que muita gente também o temera. Apesar de nunca ter visto uma foto ou ilustração, ele deveria ser terrível. Uma espécie de gigante numa malha bem apertada com um "M" vermelho de sangue escorrendo no peito. Malaman era pra mim o próprio senhor das trevas. O mal encarnado, a última besta do apocalipse, o derradeiro professor de química...

Atire a primeira pedra quem nunca se contorceu ao ouvir essa oração:

"Não nos deixeis cair em tentação, mas livrai-nos do Malaman"

sábado, 7 de julho de 2007

Restituição

"Restitui. Eu quero de volta o que é meu.."


Depois de cantar essa música, pela primeira vez fiquei pensando sobre as coisas que perdi. Minhas tendência mais natural é pensar que o que perdi me foi tirado. Culpo principalmente o diabo, e num arroubo de autoridade o encosto na parede exigindo minhas coisas de volta.

Parando pra pensar mais seriamente sobre isso, me pergunto se a questão não seria ainda muito pior. Será realmente que as coisas mais importantes me foram tiradas por meio de algum ardil diabólico? Não. Minhas perdas são mais tristes. Reconheço que a maioria das coisas que perdi nào me foram roubadas. Elas foram simplesmente entregues por mim mesmo, ou ainda pior - foram literalmente colocadas de lado como um brinquedo que perde o encanto assim que se ganha um novo.

Quer tristeza maior que a não compreensão das verdades espirituais. Em raros momentos da minha vida eu tenho uma perspectiva clara do mundo espiritual. Quase sempre meus olhos estão embaçados por uma espécie de névoa que paira sobre as coisas realmente importantes. E é como se essa máquina de fumaça estivesse nas minhas próprias mãos. Não consigo dar valor real às coisas. Me sinto como Esaú, trocando a bênção de sua primogenitura por um prato de lentilhas. Não sei dar valor valor às coisas importantes, e em muitos momento eu inverto os valores.

Sou um homem rude para o mundo invisível, e há uma nuvem de pessimismo rondando o meu horizonte.

terça-feira, 3 de julho de 2007

Medíocre, eu?

Mediocridade é uma palavra que acabou ganhando um peso muito maior do que realmente se pretendia. Chamar uma pessoa de incompetente, burro ou zero à esquerda é ruim, mas chamar de medíocre é muito pior. O medíocre é o indivíduo que anda sempre na média e nunca se destaca em muita coisa. Ele passa sem ser notado - quase um vulto. Faça um pequeno teste: quando você pára pra pensar em algum colega de classe que se destacava vc pensa em quem? Eu penso normalmente em quem era muito bom e também em quem era excelentemente ruim. Já viu alguém se destacar porque tirou um sete? Talvez conseguisse se fosse em alguma prova de cálculo, onde sete significa quinze, numa escala de zero a dez. Estar na média pode ser confortável pra muita gente, mas ser chamado de medíocre é um insulto que tira outro tanto de gente do sério. Inclusive a mim.

Dia desses eu me peguei pensando sobre a mediocridade em que o meu relacionamento com Deus às vezes se esbarra. Fiquei me perguntando como alguém que tenta ser excelente em tudo (até patologicamente excelente) pode se conformar com uma experência tão superficial com Deus, se acomodando a uma vidinha meia boca, pautada simplesmente pelo que é tangível e natural. Isso anda me roubando o sono, e numa época em que pouquíssimas coisas são capazes de fazê-lo. Isso me consola de alguma forma. Meu coração embrutecido ainda sente alguma dor.

Depois de terminar a leitura de A Batalha De Todo Homem, cheguei a uma conclusão aparentemente contraditória: Meu relacionamento com Deus não tem nada de medíocre. Eu sou completamente bem sucedido no meu relacionamento com Deus, mas dentro dos moldes que eu mesmo estipulei: um relacionamento meio a meio, onde o padrão de Deus foi emaranhado com o meu. Onde eu consigo equacionar perfeitamente as minhas mazelas com meu passaporte pro céu. Sou bem sucedido porque bem no fundo (e não confesso isso sem me estremecer), é exatamente isto que eu quero: uma jornada onde a minha mão não entregue, de maneira alguma, a direção do leme. Acaba que Jesus, que era pra ser Salvador e Senhor, é destituído do senhorio e eu assumo a função.

Não quero esse tipo de vida. Não quero esse tipo de sucesso. Quero voluntariamente entregar tudo, mesmo que pra isso eu precise muito de Sua ajuda.

sábado, 16 de junho de 2007

Pós congresso? Ainda não!

Eu sei que parece bem estranho eu não postar nada sobre o último congresso do alfa e ômega, mas eu não curti esse tempo da maneira habitual. Trabalhei de mais e dormi de menos. Estou me bastando com as experiências alheias, e me alegrando nisso. Sou um homem de bastidores e gosto de transitar nesse meio um tanto sem glamour. O congresso ainda não se encerrou de todo pra mim, mas quando isso acontecer eu volto aqui

sábado, 28 de abril de 2007

Pequena manhã

Eu tenho uma paixão pueril pelas madrugadas. Não se trata de um surto de boemia ou um lapso de poeta romântico. Já vivi alguns anos atrelados aos dois, e por isso mesmo sei bem a diferença de agora. Eu gosto do cheiro da noite aberta. Eu gosto do silêncio, que é bem mais uma voz murmurante que silente. Eu gosto de ver as pessoas dormindo e de adormecer enquanto despertam. Eu gosto desse desencontro não premeditado. À noite, as coisas são o que são e não há o exagero de luz que obriga, às vezes, o disfarce. Mas apesar dessa declaração pública de amor aos ares noturnos, foi a luz quem me presenteou essa semana.

Eu me preparava pra dormir quando tive a impressão de que todas as luzes da casa dos meus pais haviam se acendido. Pelo vão da porta da sala transbordava um caudaloso feixe de luz. Demorei um pouco até me lembrar de que o sol nascia de frente pra nossa casa, mas não me demorei nada em subir as escadas e me apresentar ao sol. E eu fui literalmente alcançado por essa esperança matutina. Ali, debruçado no parapeito de uma janela, eu lembrei de muitas outras vezes em que um nascer do sol foi capaz de instaurar em mim um sentimento urgente de esperança.

Pensei também naquela manhã de um domingo de Páscoa, onde muitas pessoas acordavam com os olhos doídos de chorar e com as almas esfaceladas. Pensei naquelas mulheres que se arrastavam cabisbaixas e com o braços repletos de especiarias. Tento visualisar o túmulo aberto de Jesus, e o sol ganhando lentamente a superfície irregular da rocha entalhada, e os olhos daquelas mulheres ganhando os espaços vazios. Fiquei pensando que naquela manhã a esperança humana foi elevada ao ponto mais alto. E essa mesma manhã vem iluminando a minha vida ainda mais que o sol, e toda esperança que tenho é o eco desse grito contra a morte.

Sou todo feito de esperança.


Veja, a manhã resplandece!
Que mistérios haverá
Por trás de um raio de sol?
Tu não sabes, nem mesmo eu.
Mas chega-te à janela,
Fecha os olhos e verás.



terça-feira, 24 de abril de 2007

A doença de Maiakovski

Eu ainda estou um pouco impressionado com a fatalidade ocorrida na Universidade Tecnológica da Virgínia. Eu deveria ser politicamente correto e escrever “chocado”, mas como não concorro a nenhum cargo político, posso me reservar o direito de ser apenas correto, pelo menos comigo. Tento esquecer, mas nenhum noticiário tem me deixado: uma semana de notícias diárias, talvez horárias. E aquele maluco, que de maluco não tinha nada, ainda ganha destaque na mídia e o vídeo com seu depoimento ganha o mundo, inclusive o Brasil. Um pseudo mártir de uma causa sem causa. Na mesma semana, uma operação policial num dos morros cariocas deixa, se não me falha a memória, 19 mortos. Apareceu um dia nos jornais; talvez dois.

Não venho aqui advogar que tragédias americanas sejam supervalorizadas, por mais que eu acredite que sejam. A grande questão mesmo é que não importa de onde a tragédia venha, ou quanto tempo ela seja exposta - a gente sempre se esquece. A dor alheia é uma névoa que se dissipa com extrema facilidade, e o meu coração anda embrutecido demais para perceber nuances tão delicadas. Eu sou um bruto de atos educados: a pior espécie.

O advento de Jesus instaurou a idéia do “amor ao próximo” naquele binômio em que os mandamentos eram resumidos. Na parábola do Bom Samaritano, o Messias faz uma pergunta inquietante, e eu faço da sua a minha própria pergunta: quem é o meu próximo? Confesso que o meu próximo não tem rosto, nem nome, nem qualquer identificação. Ele é apenas um dado abstrato. Tão desconhecido quanto os que morreram na favela ou no campus universitário. Eu não consigo amar o meu próximo porque ele não é uma pessoa. Ele é simplesmente um termo bíblico, um espectro teológico. Talvez seja eu mesmo quem não lhe confira um rosto justamente para não me comprometer.

O poeta russo, Maiakovski, escreveu que, enquanto todos tinham um coração do tamanho de um punho fechado, ele sofria de uma rara anomalia anatômica: ele era todo coração. Que doença terrível! Acredito piamente que Deus possa curar qualquer doença, e ele o faz com seus critérios misteriosos. Mas hoje eu quereria que a minha oração fosse ao contrário, e que, ao invés de curado, eu fosse adoecido, profundamente adoecido. Eu quero a doença de Maiakovski.

segunda-feira, 9 de abril de 2007

Orkut, Orkut meu, quem é tão estranho quanto eu?

Resolvi fazer uma faxina no meu orkut. Se eu tivesse a noção do quanto isso seria trabalhoso, nem começaria, mas agora é tarde e não volto atrás. Enquanto eu deletava algumas comunidades, me perguntava o que realmente havia me levado a ingressar em algumas tão peculiares como "Seu Madruga pra presidente" ou "Quero Yakult de dois litros". Sei que, a essa altura do campeonato, o que não deve faltar é estudo socio-psico-ecomonicomportacional sobre o orkut, mas não sei se vocês já reparam que a maioria das comunidaes do orkut parace compartilhar da mesma natureza: a celebração das maluquices que fazemos (ou pensamos) e que achamos que ninguém mais no munda faz (ou pensa).

Eu costumava, em meio a muito espuma de xampu, segurar meu frasco de Seda com aloevera e agradecer à Academia por mais aquele prêmio. Entrava e saía ano e eu sempre ganhava um oscar. Imagine descobrir num belo dia que um ato tão idiossincrático como aquele era compartilhado poe milhares de pessoas. Eu não era tão estranho afinal - ou pelo menos não era o único. E esse sentimento vai se repetindo a cada vez que encontro mais gente que não sabe dar estrelinha, quer coca cola de vinte litros, teve um pogoball ou cursou Letras na UFRJ.

A cada dia fico mais convencido de que o Orkut é um sintoma moderno de um mal muito antigo: a dificuldade de se estabelecer uma conexão real com outra pessoa. O Orkut vem me parecendo nada mais que uma resposta superficial para um anseio extremamente profundo. Quem nunca encontrou ou foi encontrado por um velho amigo de escola? Quinze minutos de euforia e nada mais. Quem nunca recebeu um convite de alguém pra ser seu "amigo" e mal lhe cumprimenta aqui do lado de fora atire o primeiro mouse. Há sempre um bom número de exceções, claro.

Há coisas realmente boas. Eu, por exemplo descobri que tenho mais parentes que imaginava (haja Boldrinis nesse Brasil), mas isso não mudou nem um pouco a minha vida. Nem pra um cafezinho italiano a gente se convidou. A vida acontece do lado de fora do Orkut, mas não abro mão dele de jeito nenhum. Quem mais me lembraria do aniversário de mais de trezentas pessoas??

quinta-feira, 29 de março de 2007

Mudanças...mudanças

Há dois dias raspei o cabelo. Pode parecer um acontecimento fútil pra ganhar destaque nesse blog, mas já se vão mais de seis anos sem que mortal algum tenha visto meu couro cabeludo. Decisões desse tipo nunca são tomadas com antecedência muito superior a dois dias. A gente não senta e traça um plano para os meses seguintes, nem faz um gráfico demonstrando a escala ascendente da recuperção dos cachos. Não! A gente acorda e, num instante de iluminação profunda, segue para o barbeiro. Pela primeira vez eu senti o peso daquele texto bíblico que fala em irmos como ovelhas ao matadouro. O contexto nem de perto é o mesmo, e perdoem-me a ousadia da comparação.

Me senti (com o pronome assim mesmo no início da frase) como a Camila de Laços de Família. Não me refiro ao romance da Clarice Lispector (infelizmente), mas à homônima obra da teledramaturgia brasileira. Aquela, onde todo mundo é feliz no Leblon e onde ninguém esbarra num crente, afinal somos apenas 30% da população. Se dois milhões de evangélicos reunidos não conseguem chamar a atenção do Jornal Nacional, muito menos do Manoel Carlos... estou me desviando, eu sei. É que sem a proteção capilar, os pensamentos voam com mais facilidade.

Minha sobrinha demorou meia hora para me reconhecer, e eu ainda me assuto toda vez que passo por um espelho. Osmar recitaria Retrato, de Cecília Meireles, com aquela voz de baixo profundo (ele anda achando que é Cruz e Souza, e eu assino em baixo). Já carrego a minha cota de arrependimento e, por isso, não me peçam fotos. As mudanças na minha vida (e da minha vida)quase sempre acontecem assim, meio que a galope. Às vezes sou pego de suspresa pelos outros, às vezes sou tão rápido que eu mesmo me suspreendo. A corda sempre arrebenta no fio mais fraco, diria o meu cabelo.

A vida vai por aí. Vasta, grandiosa e cheia de reviravoltas. Como um rio, muda sempre e continua a mesma. E por falar nisso, resisti a essa maldita frase por todo esse texto, agora eu entrego os pontos.

Minha voz continua a mesma, mas os meus cabelos... (maldita publicidade brasileira).

quarta-feira, 21 de março de 2007

A difícil arte de permanecer de pé

Aprendi a andar pouco antes de completar um ano de idade. De lá para cá, eu não parei mais de tropeçar. Minhas quedas são proporcionais à minha vontade de permanecer de pé. Carrego no corpo uma série de marcas dessa trajetória acidentada. Algumas são bem evidentes, como as dos joelhos, mas outras ninguém percebe a não ser que eu as mostre. Boa parte dessas marcas são resultadas de pura imprudência - imprudência essa muitas vezes consciente. Outras são o resultado de um simples descuido ou acidente.Humano que sou, carrego meus tropeços para a minha caminhada com Deus.

É estranho caminhar ao lado de quem não se pode ver de olhos abertos. Talvez seja por isso que eu caia tanto. Kierkegaard dizia que a experiência de fé era sempre um salto no escuro, em direção àquilo que não se pode ver. Às vezes eu quero ter a certeza plena de que Deus está alí do meu lado, e para isso eu abro os olhos, e tropeço. Talvez por substitui-lo, frequentemente, por algo visivelmente mais tangível. Nem sempre estou realmente à sua procura. É como se eu quisesse continuar a caminhada com o corpo enquanto meus olhos se deslumbram com outras coisas. E caio. Meus joelhos estão esfolados, mais pela queda em si do que pela atitude de me prostrar, arrependido. Deveria ser ao contrário, eu sei.

Sei que o meu pecado, essa palavra intimidadora que eufemísticamente venho chamando de tropeço, se deve basicamente à minha condição de humano e de saber que o erro me é inerente. Se cedo ou tarde eu sei que vou pecar, porque me esforçar tanto para resistir? "Não posso evitar, é minha natureza", respondeu o escorpião em uma fábula bem conhecida. Pensar dessa forma me fez, durante muito tempo, conivente com as minhas mazelas e com a minha própria covardia e omissão. Também carrego, neste caso, muitas cicatrizes. É preciso chegar bem perto para se ver algumas delas e, nem mesmo eu, tenho a noção exata de cada uma.

Mesmo querendo permanecer de pé, cedo ou tarde irei cair novamente. A Graça de Deus irá me encontrar e me restaurar mais uma vez, e outra, e outra, e quantas vezes for preciso. Infelizmente, é uma grande tentação querer legitimar a não resistência baseado nessa Graça que sempre me perdoa. Afinal, Deus não se lembra dos meus pecados. As cicatrizes, contudo, ainda estão aqui, espalhadas para que eu me lembre e me envergonhe. Não como um fantasma que não se exorcisa, e,sim, como marcos pela minha trajetória. Para que eu sempre me lembre de onde venho e de quem eu posso me tornar se insistir em caminhar sozinho.

Sei que cedo ou tarde vou tropeçar nos próprios pés, mas que seja cada vez mais tarde.

terça-feira, 13 de março de 2007

Pesca maravilhosa

Numa das minhas idas e vindas a Itaperuna, escrevi que voltar, às vezes, é como nunca ter partido.É estranho revisitar essa sensação de maneiras diferentes a cada vez que venho visitar meus pais depois de sete anos morando no Rio. Apesar de nada ser como antes, algum resquício permanece inalterado. Algo que não sei precisar muito bem, mas que sinto - inegavelmente. Não quero uma explicação pra isso. Racionalizar as coisas pode roubar muito de sua beleza intuitiva. Não quero correr o risco.Um desses momento aconteceu ontem.

É muito comum eu acabar invertendo meu relógio biológio quando estou por aqui. Fico a madrugada toda imerso num monte de coisas (inclusive esse blog) e vou dormir quando todo mundo está acordando. O momento em que você pára e pensar se quer realmente dormir é um tanto perigoso, e foi justamente ele que deflagrou uma série de ações automáticas. Saí e fui até a varanda sentir o cheiro da manhã. Foi então que vi, no canto da parede, uma vara de pescar. Eu já havia passado por alí inúmeras vezes nessas semanas, mas era a primeira vez em que eu realmente olhava pra ela. Pescar... que mal isso faria.

Pescar sempre me leva de volta ao início da década de 90, onde meu avô paterno ainda era vivo. Eu revisitei esse tempo várias e várias vezes nessa manhã. Enquanto eu fisgava meus lambaris e os colacava num balde, conversava com Deus numa espécie de prosa entre amigos íntimos. Assim mesmo como somos - íntimos. Ele não disse muita coisa (Deus é um cara um tanto econômico com as palavras), mesmo assim foi perfeito. Pude parar e pensar na minha vida e no rumo que ela toma a cada dia. Percebi que estava tendo a minha própria pesca maravilhosa. Não, não pesquei toneladas de peixinhos. Percebi que também tenho jogado minhas redes em lugares em que não vejo muita possibilidade de retorno. Mas continuo jogando. Porque sinto profundamente que a Sua voz tem me guiado a fazê-lo.

Sei que, no tempo certo, elas virão repletas.

sábado, 10 de março de 2007

Aprendendo a esperar

Deixei Rosa na rodoviária de Itaperuna com o coração mais doído do que das vezes anteriores. Talvez por não ter podido acompanhá-la até o Rio e depois até o aeroporto, onde já vi meu coração ganhar os céus em aeronaves da Gol. E não era em maletas de transplantes cardíacos. É impossível se acostumar e nada te prepara pra esses momentos. Despedidas. Despedidas. Despedidas. Digo assim, três vezes, pra ver se a palavra se dissolve na minha boca e perca o sentido. Mas não perde.

Como foi fácil me acostumar com a sua presença sem me dar conta de que, cedo ou tarde, o inevitável mais uma vez nos seria inevitável. Fácil é acompanhar seu sorriso, respirar o seu suspiro, me aninhar nos seus cabelos. Fácil é querer isso todos os dias por todos os dias da minha vida. Difícil é dizer “até breve” e “o coração entender “ adeus”, e se doer como de adeus fosse. Difícil é a ausência superlativa que me leva às minhas primeiras aulas de teoria literária: "Ausência não é falta. Falta é aquilo que não se tem. Ausência é aquilo que por se ter demais, não cabe no discurso. Extrapola". Fora dos livros a teoria é sempre outra. Ausência é a presença que nos falta e cresce ao nos encher de vazio.

Continuo aqui, à espera da plenitude do encontro, onde o abraço não se aparta e o beijo não se cala. Continuo aqui, a 2180 quilômetros da distância que só irá se completar horas depois de postar esse texto. Contrariando o que muita gente acredita, paciência não é uma das minhas maiores virtudes. Esperar é sempre difícil, mas difícil mesmo é não ter esperança.

terça-feira, 6 de março de 2007

Fundo pro fundo profundo

Se alguém tentou ler esse texto no fundo do meu blog deve tê-lo achado um tanto estranho. Não é por causa das lacunas não. Ele é estranho mesmo e na íntegra:


Fazer-se esquecida a voz. A palavra olvida. Somos todos feitos de puro
esquecimento. Nossa lembrança é a luta contra a falta de espaço, contra o vazio.
O que é importante salta à superfície, o que é escuro submerge. Vez por outra, a
tensão é invertida: o que é importante adormece à sombra do escuro iluminado.

Nosso suplício é limpar o rosto com as mãos manchadas; e não há espelho algum.
Há somente o olho alheio. Dizemos que o tempo apaga, mas o tempo é a borracha
velha que nada esconde, só espalha a mancha sobre a folha. Se a palavra fosse ao
vento, era a poeira. Ora em tempestade ora invisível, mas alí. Somos todos
feitos de esquecimento. Feitos da palavra que não volta. Feitos da palavra que
fica, escrita, ouvida, ou vida ou morte.

Somos todos feitos de caminhos. Esquecemos sempre para onde vamos, mas a
trajetória é mais forte que o esquecimento. Continuo caminhando. Eu sei para
onde vou, mas às vezes me esqueço. Mas Ele sempre me lembra. Palavra Olvida.
Palavra Esquecida, relembrada em sussuros. Sua voz é como a brisa: nem sempre
se ouve.

Mas está sempre aqui.



A melancolia ainda ronda. Eu quero o sopro de Deus.

segunda-feira, 5 de março de 2007

A Indesejada das gentes

Enquanto escrevo esse texto, minha antiga igreja está lotada. Isso não é nada fantástico conhecendo de antemão a Casa de Oração em Retiro do Muriaé. Mas o fato é que não há espaço algum dentro do templo. Enquanto muita gente se espreme nas janelas, outras se apinham nos corredores. Dentro, um homem segura uma Bíblia a aberta e fala devagar. Ao seu lado, Lília ocupa um caixão florido. Ela é minha prima, mas passei a vida inteira chamando-a de tia. Tia Lília morre com pouco mais de cinqüenta anos depois de dez anos de luta contra oAlzheimer.

Eu vivo tentando não pensar na morte, mas ela não deixa. Vez por outra ela se esgueira ao meu redor tentando me lembrar de que, cedo ou tarde, serei o próximo, ou pior – alguém que eu realmente ame. Ela me assusta. Não pelo que virá depois, mas pelo encontro propriamente dito. Eu quereria morrer dormindo pra nunca saber que morri.

Sou cristão, e digo isso como se falasse de um tempo onde isso fizesse mais sentido do que faz hoje. Minha fé nem sempre me ajuda, mas nunca me atrapalha. Acredito no céu e, em momentos como esse, é pra lá que se voltam os meus pensamentos. Muitas vezes eu fugi para o céu por não suportar a terra, mas hoje eu penso nele com os meus dois pés cravados no chão. E tenho esperança.

Eu não irei ao velório, e não irei pelo mesmo motivo que não vou a velório algum: qualquer lembrança é melhor de se guardar do que essa. E tenho lembranças melhores. Enquanto escrevo, a morte me carrega um pouco... e me lembro de um poema que escrevi há algum tempo e que terminava assim:

Pequena morte

A nos levar pequenas partes

Até ser grande

E nos levar completamente.


Apesar da melancolia, o que me salta à mente a urgência da vida. Essa vida frágil e preciosa.

Carpe Diem.

sábado, 3 de março de 2007

Primeiras palavras

Já perdi a conta (talvez por nunca tê-la feita) de quantos diários já escrevi nessa minha vida. Mas isso não significa que eu tenha terminado algum. Não pensem, por favor, que essa irresponsabilidade literária se estenda por outras áreas da minha vida. Ostento, com certo orgulho, o meu montante de projetos bem terminados. A culpa não é minha; é da prosa.

Sempre me dei melhor com textos concisos, e os meus cadernos de poemas não me deixam mentir sozinho. Na verdade a culpa é da palavra. Não a palavra que se junta a outra e outra nessa minha sitaxe maltrapilha, mas a palavra que você definitivamente não vai encontrar nesse texto. A culpa é da palavra que não encontro. Aquela que, numa espécie de Big Bang (verdadeiro) é capaz de explodir e povoar tudo de significado.

Precisei cursar toda a Faculdade de Letras para descobrir que , no fundo, a minha paixão era pela imagem. " Uma imagem vale mais que mil palavras", diria algum sábio de plantão. Mas é nesse ponto que me sinto acuado, terrivelmente acuado. Não seria a palavra - essa palavra grafada e lida - também uma espécie de imagem que decodifico?

Teorias e sono à parte, estou tentando confessar da melhor maneira possível que [engolindo em seco] tenho uma absurda preguiça em escrever. Sobretudo quando sei que escrevo unicamente pra mim: testemunha ocular de tudo o que me acontece. Não sei se, ao trocar o papel tradicional por esse feito de zeros e uns, me saio melhor. A esperança é a última que morre.